DE CABRITOS A ACADÊMICOS OU VICE-VERSA

por Elsie Studart
Aproveitando o mote do Audífax Rios, articulista das sextas-feiras do jornal O Povo (ver edição de 15/06/2012), apesar de não gostar dos achismos, achei interessante o seu verbo ao se pronunciar sobre a vontade que muitos têm de ingressar na academia. Primeiro, pelo próprio titulo que deu ao texto: “De Cabritos e Acadêmicos”; segundo, pela velada insinuação do uso do Clube do Bode, como corredor de entrada para a ACL; terceiro, pela alusão à bagagem dos pretensos candidatos, que pode exceder no peso, mas pecar pela falta de substância. Isso é o que dá a entender as palavras, bem arrumadas, diga-se de passagem, do artista plus, misto de pintor e escritor, oriundo lá das bandas de Santana do Acaraú.
Estou com ele quando diz que o Clube do Bode é democrático, que ali tem de tudo, desde os papos literários com “gente de cabeça”, às tomadas de “umas e outras”, uma “loira” gelada, preferencialmente, saída do Flórida Bar. Ocupar cadeiras cativas, naquele famoso reduto de inteligências vivas, pode até ser visto como privilégio de alguns, mas ter assento lá, quando bem “der na telha” é um direito de quem, apesar de não gostar da “água que passarinho não bebe”, nem assim dispensa uma tragada de uns bons goles de sabedoria, sorvidos nas mesas acanhadas, onde pontuam dos políticos aos literatos, dos megastars aos cronistas da vez.
Fico, no entanto, do lado oposto do articulista, quando ele faz um contraponto entre a facilidade de pertencer a uma Academia, começando por frequentar o Clube do Bode, e a dificuldade de um pai de chiqueiro escalar os umbrais desse templo de saber, mesmo com a carroça abarrotada de livros. Se existe pecado do lado de baixo do Equador, esse foi um, acredito eu.
Basta considerar que, por vontade da população de Fortaleza, em que pese o tom de molecagem do cearense, o “Bode Ioiô” foi eleito para a Câmara Municipal; se isso foi possível, por que não um pai de chiqueiro, se alinhar a tantos outros que já dão os seus berros na Academia? A questão é de tempo e de oportunidades. É fazer como Arquimedes: “Dê-me uma alavanca e eu moverei o mundo”. Ter assento na cadeira da ACL, pode significa fazer de uma cobra que silva, um cabrito que sabe berrar.
Quanto à carroça abarrotada de livros, julgo ser melhor do que vir esvaziada. Compositor de uma musica só, mesmo que boa, às vezes cai no esquecimento, como a “Helena, Helena, Helena”, ganha em um festival por Alberto Land, que apareceu e desapareceu, como por encanto. Se quantidade não é qualidade, aí fica com quem não teve tempo para apreciar a dita cuja carga livresca. Não dá para esquecer a fábula daquele caminhão apinhado de porcos. Só quem grunhia, era quem estava por baixo.
Com certeza, não se chama qualquer um, para fazer seu tatoo no Clube do Bode. Se isso acontecer, não é de graça ter o nome constando da ata, com registro da passagem naquele local. Bode que é bode, de verdade, gosta de chiqueiro, donde a pretensão de, vez por outra, dar uma parada no clube, para papear, ou o que seja, trocar berros com os outros frequentadores e, quem sabe, sair contaminado por fortes elucubrações mentais, sem desprezar o cheiro, que é sui generis. O Audífax Rios conhece bem o mapa da mina. Só precisa ensinar a quem menos tarimbado, ver para crer um remanescente do Ioiô soltar um rugido lá perto da Monsenhor Tabosa, que vai atravessar parte da cidade, respondendo lá nas vizinhanças da Igreja do Rosário. A Raquel de Queiroz, feita de bronze, mas sentada ali na Praça dos Leões, mesmo sem os óculos, surrupiados pela bandidagem de plantão, certamente, vai estar de olho em quem deixa a ACL e em quem entra para sentar na cadeira desocupada.
O Ceará tem disso, sim: para ser acadêmico, não precisa ser bode. Basta saber berrar, melhor dizendo, escrever. Cabrito que é bom cabrito, desde cedo sabe que quem berra não mama.
N. do E.
Alberto Land, que estudou violão com Rildo Hora, compôs a antológica "Helena, Helena, Helena". Em 1968, venceu o "Festival Universitário da TV Tupi" com esta canção, interpretada por Taiguara. Foi vítima de assassinato no Rio de Janeiro, em julho de 2002. PG

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